segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

351ª Nota - O verdadeiro sentido da peregrinação


Catolicismo n° 22, outubro de 1952

RECEBENDO em Castelgandolfo um grupo de “Companheiros da São Francisco”, que partiam a pé para Assis em comemoração do 25º aniversário de sua associação, o Santo Padre Pio XII dirigiu-lhes palavras em que recorda o verdadeiro sentido e a utilidade espiritual da peregrinação. Disse Sua Santidade:

“Restituir ao século do automóvel, da estrada de ferro, do avião, a noção do alto significado espiritual da peregrinação, da estrada tenazmente palmilhada rumo às alturas consagradas pelo heroísmo dos Santos, eis certamente uma empresa digna dos grandes séculos de fé.

Nossos contemporâneos perderam muitas vezes, juntamente com a noção do sobrenatural, o senso das belas obras da criação, sobretudo dos lugares e coisas santificados pelas almas de escol, por aqueles que Deus marca com o Seu sinal e encarrega de transmitir a seus irmãos os dons do céu. A exemplo de Francisco de Assis, procurais reencontrar esta primeira manifestação da bondade e da grandeza de Deus pela contemplação de Sua obra. Ides reaprender fielmente esta grande lição nos lugares animados outrora por sua presença, diante das paisagens que o auxiliaram a elevar-se para o Senhor.

Vós ides sobretudo como peregrinos, ansiosos por ali renovar vossas profundas energias e por rejuvenescer vossas almas nesta fonte sempre fresca que São Francisco fez jorrar sobre a terra da Úmbria.

Uma tal meta não se pode atingir sem uma intensa preparação espiritual. De vossa parte, haveis escolhido a da peregrinação, tão tradicional e ao mesmo tempo tão eficaz. A peregrinação é uma longa caminhada, que começa por uma separação. Deixa-se sua própria região, a vida de todos os dias, esquece-se todas as lembranças banais ou mesquinhas, que entravam e freiam os melhores impulsos. E toma-se corajosamente a estrada. Renuncia-se às fáceis certezas da refeição, do alojamento; domina-se a fadiga. A oração abre então mais facilmente seu caminho para Deus. Quando o descanso reúne os companheiros, um fervor íntimo enriquece as almas, e difunde-se dentro em pouco ao uníssono de uma prece, de um canto, de uma troca de pensamentos e de sentimentos. Ela se exalta sobretudo, em uma tensão toda recolhida, ao redor do altar, quando o Corpo de Cristo oferecido em sacrifício vem alimentar o cristão em marcha para o Senhor.

A peregrinação reeduca em vós o espírito de penitência, o sentido da Providência e da confiança em Deus. Ela vos relembra mesmo, pode-se dizê-lo, o sentido da vida: um desapego do presente, das alegrias e tristezas de que se tecem vossos dias, para avançar rumo a um termo cujo atrativo vos fascina. Mas impossível de lá chegar sem uma renúncia à facilidade, às comodidades, e sobretudo sem guardar viva no fundo do coração a esperança que sustem vosso esforço. Os jovens cristãos compreenderam hoje em dia que escola de formação espiritual encontrariam neste caminhar. Não um caminhar profano, onde só se, procura a união com a natureza, mas um caminhar santificado pela oração e pela caridade”.


Nota: Nas peregrinações medievais notava-se não somente pessoas sãs que transpunham frequentemente a pé grandes distâncias, mas também doentes que se expunham corajosamente às intempéries e às fadigas, transportados em veículos primitivos.