terça-feira, 19 de dezembro de 2017

352ª Nota - Entorpecimento espiritual: raiz dos males atuais


Fique bem claro, caros filhos, que, na raiz dos males atuais e de suas funestas consequências, não está, como antes da vinda de Cristo ou nas regiões pagãs, a ignorância invencível dos destinos eternos do homem e das vias fundamentais para atingi-los, mas antes a letargia de espírito, a anemia de vontade, a frieza dos corações. Os homens atingidos por esse contágio tendem, para se justificar, a rodear-se das antigas trevas e procuram um pretexto em novos e antigos erros. É pois sobre suas vontades que é preciso agir (Pio XII, em Exortação aos fiéis de Roma, de 10-11-1952).

segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

351ª Nota - O verdadeiro sentido da peregrinação


Catolicismo n° 22, outubro de 1952

RECEBENDO em Castelgandolfo um grupo de “Companheiros da São Francisco”, que partiam a pé para Assis em comemoração do 25º aniversário de sua associação, o Santo Padre Pio XII dirigiu-lhes palavras em que recorda o verdadeiro sentido e a utilidade espiritual da peregrinação. Disse Sua Santidade:

“Restituir ao século do automóvel, da estrada de ferro, do avião, a noção do alto significado espiritual da peregrinação, da estrada tenazmente palmilhada rumo às alturas consagradas pelo heroísmo dos Santos, eis certamente uma empresa digna dos grandes séculos de fé.

Nossos contemporâneos perderam muitas vezes, juntamente com a noção do sobrenatural, o senso das belas obras da criação, sobretudo dos lugares e coisas santificados pelas almas de escol, por aqueles que Deus marca com o Seu sinal e encarrega de transmitir a seus irmãos os dons do céu. A exemplo de Francisco de Assis, procurais reencontrar esta primeira manifestação da bondade e da grandeza de Deus pela contemplação de Sua obra. Ides reaprender fielmente esta grande lição nos lugares animados outrora por sua presença, diante das paisagens que o auxiliaram a elevar-se para o Senhor.

Vós ides sobretudo como peregrinos, ansiosos por ali renovar vossas profundas energias e por rejuvenescer vossas almas nesta fonte sempre fresca que São Francisco fez jorrar sobre a terra da Úmbria.

Uma tal meta não se pode atingir sem uma intensa preparação espiritual. De vossa parte, haveis escolhido a da peregrinação, tão tradicional e ao mesmo tempo tão eficaz. A peregrinação é uma longa caminhada, que começa por uma separação. Deixa-se sua própria região, a vida de todos os dias, esquece-se todas as lembranças banais ou mesquinhas, que entravam e freiam os melhores impulsos. E toma-se corajosamente a estrada. Renuncia-se às fáceis certezas da refeição, do alojamento; domina-se a fadiga. A oração abre então mais facilmente seu caminho para Deus. Quando o descanso reúne os companheiros, um fervor íntimo enriquece as almas, e difunde-se dentro em pouco ao uníssono de uma prece, de um canto, de uma troca de pensamentos e de sentimentos. Ela se exalta sobretudo, em uma tensão toda recolhida, ao redor do altar, quando o Corpo de Cristo oferecido em sacrifício vem alimentar o cristão em marcha para o Senhor.

A peregrinação reeduca em vós o espírito de penitência, o sentido da Providência e da confiança em Deus. Ela vos relembra mesmo, pode-se dizê-lo, o sentido da vida: um desapego do presente, das alegrias e tristezas de que se tecem vossos dias, para avançar rumo a um termo cujo atrativo vos fascina. Mas impossível de lá chegar sem uma renúncia à facilidade, às comodidades, e sobretudo sem guardar viva no fundo do coração a esperança que sustem vosso esforço. Os jovens cristãos compreenderam hoje em dia que escola de formação espiritual encontrariam neste caminhar. Não um caminhar profano, onde só se, procura a união com a natureza, mas um caminhar santificado pela oração e pela caridade”.


Nota: Nas peregrinações medievais notava-se não somente pessoas sãs que transpunham frequentemente a pé grandes distâncias, mas também doentes que se expunham corajosamente às intempéries e às fadigas, transportados em veículos primitivos. 

sexta-feira, 15 de dezembro de 2017

350ª Nota - O Nazismo: um movimento de esquerda ou de direita?


Sob o título de "Socialismo no Nacional Socialismo" ou "A falsa interpretação marxista do movimento nazista", publicou o tradicional semanário católico inglês "The Tablet", em seu número de 30 de agosto do corrente ano, um esclarecedor estudo em torno da mistificação que vem sendo feita no que tange ao papel revolucionário do nazismo.
Ressurge a questão com o problema do rearmamento da Alemanha Ocidental. Não é somente a ala bevanista do socialismo inglês que se mostra contrária a esse rearmamento, fazendo assim o jogo soviético. Também o sr. Attlee, em recente debate na Câmara dos Comuns, inflamado de zelo democrático e de amor por seus irmãos os socialistas teutos, manifestou os seus receios de que através do rearmamento alemão os infames capitalistas promovam o renascimento do nazismo, apontando mesmo o perigo de que, ao se organizar um exército de voluntários na República de Bonn, "o elemento nazista seja o primeiro a se alistar".

A UNIFORMIDADE COLETIVISTA

Ora, a argumentação do líder trabalhista britânico encobre uma grande ignorância ou uma enorme hipocrisia a respeito do fundo ideológico da luta política e social de nossos dias. E como mesmo no Brasil está reaparecendo a aliança do nacionalismo com o socialismo, torna-se muito oportuno resumir para os nossos leitores o mencionado artigo do "Tablet".
A conexão desses erros teve inicio com o seu próprio aparecimento há cento e cinqüenta anos atrás, recebeu sua forma final em meados do século passado, quando o socialismo começou a espalhar-se sob o aspecto "internacional". Foi a Revolução Francesa que deu ímpeto ao esquerdismo na Europa, e a essência real do esquerdismo deve ser procurada não tanto em uma filosofia materialista, mas na tendência "identitária" que deseja transformar a humanidade (ou uma parte específica da humanidade) segundo linhas uniformistas e coletivistas. A concretização de tal programa visionário, que se baseia em um molde específico, somente é possível através da captura do governo por um partido ("o" partido) que então se entrega à faina brutal de refazer a sociedade pela coerção.

AS ORIGENS ESQUERDISTAS DO NAZISMO

Nestas considerações temos que achar a chave dos erros cometidos tão freqüentemente pelos elementos "progressistas" que mostram pendores para o socialismo.
O nacional-socialismo, como frisou um de seus aderentes da primeira hora, é "a síntese de duas grandes forças deste país — nacionalismo e socialismo" (Prof. J. Pfitzner, executado em 1945). Os aspectos sinônimos das expressões "nacionalização" e "socialização" por si sós nos deveriam dar uma pista para descobrir a verdade nessa questão. Na própria gênesis do Partido Nazista as forças da esquerda (muito mais que as da direita) foram responsáveis pelo seu nascimento. De início tomando corpo como Partido dos Trabalhadores Germânicos (DAP), organizado na Boemia e Morávia para competir com o Partido Nacional Socialista Checo (estabelecido por socialistas vermelhos depois de um cisma), finalmente aceitou o rótulo "Nacional Socialista" em maio de 1918, isto é, antes do Armistício. Transplantado para a Alemanha, mas fracassando na católica Baviera em 1923, conquistou o Reich através de uma série de vitorias eleitorais no Norte e no Nordeste. Copiando a técnica do Partido Social Democrático (socialista), mobilizou os não-votantes habituais bem como os elementos dos partidos democráticos. Mantendo sua estrutura de infra-classe média, penetrou extensamente nas classes trabalhadoras.

A FÁBULA CAPITALISTA

Gustav Stolper, um refugiado austríaco falecido na América do Norte, foi talvez o primeiro a assinalar, em um livro muito oportuno ("Esta Era de Fábulas", Nova York, 1942), que a apresentação do nazismo como a derradeira linha de defesa do capitalismo moribundo, foi um esforço desesperado para explicar o fenômeno nazista em termos marxistas. Stolper recordava a seus leitores que a vasta maioria dos intelectuais refugiados da Alemanha hitlerista pertenciam ao campo marxista (socialista e comunista), e que esses homens não tinham outra explicação "ortodoxa" da ascensão de uma ideologia que os tornou sem pátria, senão no velho chavão de todos os marxistas fanáticos, ou seja, o capitalismo. Com efeito, o nazismo, a seus olhos, não podia passar de produto traiçoeiro dos infames capitalistas, que deviam ter "financiado" essa monstruosidade.
É bem verdade que certos homens de negócio alemães de fato contribuíram com algum dinheiro para o Partido Nazista, do mesmo modo que os taverneiros americanos nos dias da Proibição estipendiaram os gângsteres e contrabandistas de bebidas de modo a deles receber "proteção". E o fato de dinheiro judaico haver sido canalizado para os mesmos fins poderia servir para sublinhar o drama de minorias em um sistema democrático em que grandes contingentes de eleitores habilmente manobrados poderiam "retirá-las do negocio". Aliás é um assunto que merece estudo à parte, este da ajuda prestada por capitalistas hebraicos à causa do nazismo. Não obstante, Stolper muito claramente demonstra que a ajuda financeira desses homens de negócio foi sensivelmente menor que a fornecida pelas massas que tomaram cartões de inscrição no Partido e regularmente pagaram suas contribuições.

NAZISMO E "ASCENSÃO DAS MASSAS"

O nazismo nunca foi uma conspiração de junkers de sangue azul, de nédios sacerdotes e de generais de galões dourados contra o "homem comum", mas, muito pelo contrário, foi uma revolução insuflada nas massas alemãs contra suas elites que, além do Primeiro e do Segundo Estados, também incluíam uma coorte de intelectuais e artistas, odiados por motivo de seus aspectos esotéricos e "antidemocráticos", e, finalmente, o que se convencionou chamar de "plutocracia". Os nazistas constituíam o partido da "vasta maioria" ( votações maciças de noventa por cento) aliciada contra as minúsculas, pouco populares minorias; o partido das "luzes" do século XIX e do kulturkampf contra os valores permanentes da tradicional civilização cristã que sempre foi pela liberdade, pela diversidade, pela personalidade e pela perenidade, contra a escravidão, contra o coletivismo, contra a uniformidade.
Permanecem de pé corno fatos incontestáveis o contubérnio do nazismo com um materialismo biológico e com uma noção barata de ciência, e sua tendência sedentariamente urbana e anti-agrária. É verdade que o nazismo atacou a propriedade preferentemente de modo diverso do usual padrão socialista — não pelo confisco, mas pela fusão do próprio conceito de propriedade na fornalha incandescente de um autêntico Estado totalitário, tornando-se os proprietários meros mordomos ou administradores de suas "propriedades". Mas, do mesmo modo que o esquerdismo liberal da Revolução Francesa, começou os confiscos diretos pela usurpação dos bens da Igreja.

NAZISMO, PRECURSOR DA BOLCHEVIZAÇÃO DAS MASSAS

A estas considerações do Tablet podemos acrescentar que a 19 de outubro de 1936 o jornal católico holandês "Maasbode" denunciava o nazismo como o "precursor da bolchevização das massas", transcrevendo uma carta-aberta de Goebbels (publicada no órgão oficial do Partido Nazista, "Voelkische Beobachter") endereçada ao chefe comunista em Moscou, do teor seguinte: "Nós nos combatemos reciprocamente, sem sermos verdadeiramente inimigos. Assim fazendo, malbaratamos nossas forças e jamais alcançaremos nossos fins. Pode ser que a extrema necessidade nos aproxime. Pode ser! Nós, jovens, carregamos conosco a sorte das gerações futuras. Não o esqueçamos jamais. Eu vos saúdo!"
E acrescentava o "Maasbode" que o nazismo não combatia o bolchevismo como tal, mas o comunismo enquanto sistema concorrente na política interna, e a Rússia soviética como um adversário no tabuleiro do xadrez internacional.
Todo o "folclore" dos nazistas pertencia à extrema-esquerda — sua bandeira vermelha não menos que seu anticlericalismo, seu ódio à tradição não menos que o emocionalismo que os liga diretamente às seitas ferozmente esquerdistas, milenaristas e radicais do passado.

IRRESISTÍVEL PENDOR PARA A ESQUERDA

Por todas estas razões prossegue o Tablet não é mera coincidência que zelotes da primeira hora do nazismo tenham sido largamente absorvidos pelos partidos da esquerda após 1945. É altamente significativo que muitos nazistas austríacos tenham achado refúgio congenial no "Partido Independente" (VdU) cujos membros na última eleição presidencial tornaram possível a vitória de um candidato socialista (metade dos Independentes se abstiveram e um terço deu seus votos ao socialismo). Na Alemanha foi o líder socialista Dr. Schumacher, mais que qualquer outro, que se tornou porta-estandarte do nacionalismo alemão (e do socialismo) com suas crescentes animosidades esquerdistas contra muitas formas da ordem cristã, e especialmente da tradição católica. Aliado ao pastor Niemoeller (que, por seu lado, lança lânguidos olhares para leste), se mostrava amargamente hostil à aliança com o Ocidente e se opunha às mais práticas soluções para o problema do rearmamento alemão. Desse modo uma aliança entre os Sociais Democratas (socialistas) e os novos partidos nacionalistas da extrema direita (leia-se: extrema esquerda) não é nada impossível. Os internacionalistas e os nacionalistas uniriam suas forças contra aqueles que pensam em termos do Ocidente cristão. E quem teria a ganhar com isto senão Moscou?
O sr. Attlee não deve dirigir sua lança contra moinhos de vento, mas contra os verdadeiros continuadores e cultivadores da nefasta obra nazista: os correligionários do trabalhismo britânico na Alemanha ocidental, os socialistas.

(Excerto extraído da Revista Catolicismo)

quinta-feira, 14 de dezembro de 2017

349ª Nota - Conto de Fadas faz bem às crianças?


“O conto de fadas é acusado de dar às crianças uma falsa impressão do mundo em que vivem. Na minha opinião, porém, nenhum outro tipo de literatura que as crianças poderiam ler lhes daria uma impressão tão verdadeira. As histórias infantis que se pretendem ‘realistas’ tendem muito mais a enganar as crianças.” (C. S. Lewis, in Três maneiras de escrever para crianças)

Segundo Tolkien, os contos de fadas podem oferecer ao espírito humano, além de seu valor literário em si, quatro outras experiências: Fantasia, Recuperação, Escape e Consolo.

A Fantasia é uma forma de arte derivada da Imaginação, que visa a produzir imagens que não estão presentes no que Tolkien chama de Mundo Primário (a realidade de fato) e a liberdade de dominação dos “fatos” observados, ou seja, do fantástico. Afirma também que a Fantasia é o poder de produzir Encantamento, e que não afronta a razão.

“A Fantasia é uma atividade humana natural. Certamente ela não destrói, muito menos insulta, a Razão; e não abranda o apetite pela verdade científica nem obscurece a percepção dela. Ao contrário. Quanto mais aguçada e clara for a razão, melhor fantasia produzirá.”

A Recuperação é um modo de readquirirmos o deslumbramento, a admiração pelas coisas que se tornaram corriqueiras em nossos dias, coisas com as quais não nos importamos mais, mas que carregam em si mesmas o mistério da vida. (...) Perceber por meio da Fantasia, o quão maravilhoso é o mundo enquanto criação de Deus, que as coisas simples da natureza, com as quais lidamos no dia a dia – uma flor, um gramado verde vivo após a chuva (ou a chuva mesma) –, são de uma beleza inconteste, que nos levam àquilo que Chesterton disse tão bem-humoradamente: “Eu sempre acreditava que o mundo envolvia uma mágica: agora achava que talvez ele envolvesse um mágico”.

O Escape envolve uma ligeira sutileza. Escape não é a mesma coisa que escapismo. Com essa distinção Tolkien quer dizer que não se pode confundir “o escape do prisioneiro com a fuga do desertor”. Sua concepção de escape trata do desejo de ultrapassar o ordinário, e muitas vezes aterrador, cotidiano.

Por fim, o Consolo, mais precisamente o Consolo do Final Feliz. Tolkien diz que assim como a Tragédia é verdadeira forma do Drama, o Consolo do Final Feliz é a verdadeira forma das histórias de fadas. Para facilitar a compreensão do conceito, Tolkien criou um termo: Eucatástrofe (boa catástrofe), que é a mudança repentina de uma situação de revés ao final de uma história; a alegria do final feliz, que, diferente de ser “escapista” ou “fugitiva”, demonstra uma graça repentina, um milagre. E arremata dizendo que a própria História Cristã é a maior eucatástrofe concebível; que o nascimento de Cristo é a eucatástrofe da história do Homem, e a ressurreição é a eucatástrofe da história da Encarnação. 

(Ficção científica contra o cientificismo: teologia e imaginação moral na trilogia cósmica de C. S. Lewis, 2016, de Paulo Cruz) 

segunda-feira, 11 de dezembro de 2017

348ª Nota - Santo Tomás de Aquino confirma a posição sedevacantista


Santo Tomás de Aquino (1225-1274) é o maior de todos os doutores da Igreja. É chamado “Doutor Comum”, “Doutor Angélico” ou “Anjo da Escola”, em razão da excelência de sua doutrina. Foi exaltado frequentemente pelos Papas.
“Tomás, sozinho, iluminou mais a Igreja do que todos os outros doutores. Sua doutrina somente poderia ter vindo por uma ação milagrosa de Deus” (João XXII na bula de canonização).

Que nos ensina esse doutor quase tão infalível quanto o Papa? O Doutor Angélico é partidário da infalibilidade absoluta e permanente do Soberano Pontífice:
“A Igreja apostólica (de São Pedro), situada acima de todos os bispos, de todos os pastores, de todos os chefes da Igreja e dos fieis, permanece pura de todas as seduções e de todos os artifícios dos hereges em seus pontífices, em sua fé sempre inteira e na autoridade de Pedro. Enquanto as outras igrejas são desonradas pelos erros de certos hereges, somente Ela reina, apoiada sobre fundamentos inabaláveis, impondo silêncio e fechando a boca de todos os hereges; e nós (...), confessamos e pregamos em união com Ela a regra da verdade e da santa tradição apostólicas.” (Citação de São Cirilo de Alexandria por Santo Tomás de Aquino em sua “Catena Áurea”, em seu comentário sobre o Evangelho de São Mateus, XVI, 18.)

Apoiando-se sobre São Lucas, XXII, 32, o Doutor Comum ensina que a Igreja não pode errar, porque o Papa não pode errar, e, portanto, não pode promover o erro nem a heresia.
A Igreja universal não pode errar, pois Aquele que é ouvido em tudo por força de sua dignidade disse a Pedro, sobre a profissão de fé em que a Igreja é fundada: ‘Eu roguei por ti para que tu fé não vacile jamais’” (Suma Teológica, II-II, q. 1, a. 10).
“Uma vez que as coisas foram decididas pela autoridade da Igreja universal, quem se recusar obstinadamente a submeter-se a esta decisão, seria herege. Esta autoridade da Igreja reside principalmente no soberano Pontífice. Pois foi dito (Decreto XXIV, q. I. c. 1.2): ‘Todas às vezes que uma questão de fé é agitada, penso que todos nossos irmãos e todos nossos colegas no episcopado somente devem se remeter a Pedro, a saber, pela autoridade de seu nome e de sua glória’”.
Nem os Agostinhos, nem os Jerônimos, nem nenhum outro doutor defendeu sentimento contrário a sua autoridade. É por isso que São Jerônimo dizia ao Papa São Dâmaso (in expo. Symbol.): “Tal é a fé, Santíssimo Padre, que aprendemos na Igreja Católica: se em nossa exposição se encontrar alguma coisa pouco exata ou pouco segura, nós te rogamos que a corrija, tu que possuis a fé e a Sede de Pedro. Porém, se nossa confissão recebe a aprovação de vosso julgamento apostólico, quem quiser me acusar provará que é ignorante ou mal intencionado, ou que não é católico, e não provará que sou herege” (Suma Teológica, II-II. q. 11. a. 2).

“É necessário ater-se à sentença do Papa, a quem pertence o pronunciar-se sobre matéria de fé, muito mais que a opinião de todos os sábios” (Quaestiones quodlibetales q. 9 a 16).

No Salmo XXXIX, 10, está escrito: “Eu anuncie a Tua justiça na grande assembleia”. Eis o comentário de Santo Tomás: “O salmista falou ‘em grande assembleia’, isto é, na Igreja Católica, que é grande por seu poder e firmeza: ‘As portas do Inferno não prevalecerão contra ela’” (S. Mateus, XVI, 18)

Esta firmeza, a Igreja a deve em primeiro lugar à fé sem falha do Pontífice Romano como é explicado em um dos opúsculos do santo doutor: “A Igreja é Una, Santa, Católica e Firme. (...) Quarto: Ela é firme. Uma casa é firme: 1) quando suas fundações são sólidas. A verdadeira fundação da Igreja é Cristo (1 Coríntios, III, 2) e os doze apóstolos (Apocalipse, XXI, 14). Para sugerir a firmeza, Pedro é chamado de rocha. 2) A firmeza de uma casa se manifesta também quando não pode ser derrubada por uma sacudida. A Igreja não pode ser derrubada nem pelos perseguidores, nem pelas seduções do mundo, nem pelos hereges. Segundo São Mateus, XVI, 18, as ‘portas do inferno’ (= hereges) podem triunfar sobre tal ou qual igreja local, porém não contra a Igreja de Roma donde reside o Papa. É por esta razão que somente a Igreja de Pedro permanecerá sempre firme na fé. E enquanto que em outra parte a fé não está completa, ou melhor, mesclada com muitos erros, a Igreja de Pedro, ela, é forte na fé e pura de todo erro, o que não é surpreendente, visto que o Senhor disse a Pedro: ‘Eu roguei por ti, para que tua fé não desfaleça’” (Santo Tomás: Opuscula, opúsculo intitulado Expositio symboli apostolorum, passagem relativa ao artigo “Eu creio... na Igreja Católica” do Símbolo dos Apóstolos).

O ensinamento do Doutor Angélico, por conseguinte, pode se resumir assim: A fé do Papa é de uma firmeza absoluta e permanente. A doutrina do Doutor Angélico deve ser “tida religiosamente” (santa) por todos os professores de seminários (cânon: 1.366, § 2). A Igreja dá a entender por isto o quanto Ela julga necessário que os jovens seminaristas (que mais tarde formarão o baixo e alto cleros) sigam em tudo o Doutor Comum.

São Pio X dizia: “Afastar-se de Santo Tomás é se colocar em grave perigo” (Motu Proprio Sacrorum Antistitum, 1º de setembro de 1910).

Ademais: “Aqueles que se afastam de Santo Tomás são por causa disto levados a tal ponto que se arrancam da Igreja” (Carta Delata Nobis, 17 de novembro de 1907, dirigida ao padre Thomas Pègues).

quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

347ª Nota - Santo Tomás de Aquino e o Sedevacantismo


“A Igreja apostólica (de São Pedro), situada acima de todos os bispos, de todos os pastores, de todos os chefes da Igreja e dos fieis, permanece pura de todas as seduções e de todos os artifícios dos hereges em seus pontífices, em sua fé sempre inteira e na autoridade de Pedro. Enquanto as outras igrejas são desonradas pelos erros de certos hereges, somente Ela reina, apoiada sobre fundamentos inabaláveis, impondo silêncio e fechando a boca de todos os hereges; e nós (...), confessamos e pregamos em união com Ela a regra da verdade e da santa tradição apostólicas.”
(Citação de São Cirilo de Alexandria por Santo Tomás de Aquino em sua “Catena Áurea”, em seu comentário sobre o Evangelho de São Mateus, XVI, 18.)

NB: diante disso, como podem ainda muitos admitir e aceitar inconteste que Francisco Bergoglio seja Papa e sua falsa Igreja, a Igreja Católica, Apostólica, Santa e “firme” (como a qualificava o doutor Angélico).

terça-feira, 5 de dezembro de 2017

346ª Nota - Que é a Beleza?


A Beleza consiste, portanto, na aquisição da Sabedoria que, por sua vez, é a instalação da ordem na vida, a paz interna, a felicidade do mundo espiritual autônomo e independente do agir no mundo.

Essa ênfase estoica na filosofia moral não era novidade no Ocidente. Fazia parte da tradição socrático-platônica considerar os temas filosóficos sob o prisma metafísico do Bem, da Verdade e do Belo. Essa tendência foi acentuada pelo Neoplatonismo (sécs. III-VI). Plotino (c. 205-270), filósofo grego, talvez o mais proeminente pensador entre os neoplatônicos, dedicou um capítulo de suas Enéadas (Ἐννεάδες) ao Belo. Ele dirige-se à visão, embora haja, de fato, uma beleza para a audição (pois a melodia e o ritmo são belos). Beleza é a simetria das partes e suas cores. Mas as mentes que se elevam para além dos sentidos encontram uma beleza superior, a beleza da conduta de uma vida correta – em atos, em caráteres, em virtudes. E tudo o que é relacionado à alma é belo.

Ademais, a justiça e a temperança são mais belas que a aurora e o crepúsculo, mas só podem ser apreciadas por aqueles que veem com os olhos da alma. Esses conseguem experimentar um deleite, uma alegria, um assombro: estão a contemplar o verdadeiro reino da Beleza. Lá encontra-se a alma honesta, a que é justa, nobre, digna, calma, pura de costumes (isto é, recatada, modesta), serena, impassível. Essa alma, purificada, torna-se uma forma e uma razão. Essa beleza da alma é a existência real, a verdadeira realidade. O resto, corpóreo, não é real, mas um mundo de sombras, traços, imagens irreais.

O mundo material das belezas corporais parece relegado mais decisivamente a ser imagem, traço, sombra, espectro da verdadeira beleza. Por isso, o homem deve habituar sua alma à contemplação das belas ocupações, das belas obras, e especialmente das almas daqueles que realizam essas belas obras. A beleza atrelada ao bem (ordem moral) é também um imperativo. Por isso, o símbolo maior da feiúra é a alma dissoluta e injusta, cheia de concupiscências e desequilíbrios – alma covarde, mesquinha, invejosa, infectada pelo deleite dos prazeres impuros das paixões corporais (Enéadas, I, 5).

Com Plotino já está esboçada a tríade que marcará profundamente todo o pensamento medieval: Unum, Verum, Bonum. A beleza decorre da consideração desses transcendentais. Tais esferas de valor estavam integradas, completavam-se e não podiam separar-se. Por fim, para contemplar retamente a beleza – das criaturas e da natureza – haveria uma única exigência por parte da mente contemplativa (muito mais tarde definida belamente por Dante Alighieri [1265-1321]): um olhar claro e uma mente pura (“con occhio chiaro e con affetto puro”, Paraíso, Canto VI, 87).

(Extraído do sítio Ricardo Costa – Idade Média)