quinta-feira, 29 de junho de 2017

304ª Nota - Sacerdotes tradicionalistas: sacramentos válidos?


Os mandatos de Nosso Senhor Jesus Cristo de batizar (S. Mt. 28, 19), perdoar os pecados (S. Jo. 20, 22), oferecer a Missa (S. Lc. 22, 19) etc., constituem uma lei divina que obriga todos os sacerdotes e bispos católicos até o fim dos tempos. Alguns sacerdotes estão obrigados em justiça a administrar os sacramentos; os demais estão obrigados por outras causas: por caridade ou em virtude de sua ordenação.

Estes são os princípios:
1º – Obrigação por justiça (“ex justitia”). Esta categoria compreende todos os sacerdotes com “cura animarum” (cuidado das almas).

Este termo técnico do direito canônico se refere aos sacerdotes que, em razão de seu ofício ou de um título especial de jurisdição, quer ordinária (um bispo diocesano, um superior geral, um pároco ou seus equivalentes) ou delegada (um vigário coadjutor ou assistente do pároco), estão obrigados a “apascentar uma parte em particular do rebanho de Cristo” (Merkelbach, Summa Theologiae Moralis – 3, 86).

Sua obrigação de administrar os sacramentos provêm do “direito divino que ordena aos pastores apascentar a suas ovelhas e certamente procurar seu bem espiritual e sua salvação” (Hervé, Manuale Theologiae Dogmaticae – 4, 491).

Os sacerdotes com “cura animarum” estavam gravemente obrigados pelo direito divino a prover os sacramentos aos fieis católicos capacitados para recebê-los.

2º - Obrigação por caridade (“ex caritate”). Outros sacerdotes que carecem deste tipo de jurisdição ordinária ou delegada, v.g., professores de seminários, administradores, mestres, não assinalados, retirados etc., também estão obrigados, contudo, a prover os sacramentos aos fieis, quão grave seja a necessidade de um indivíduo ou uma comunidade.

Alguns autores dizem que sua obrigação se baseia na virtude da caridade: “Quando faltam os sacerdotes com “cura animarum”, outros sacerdotes estão obrigados por caridade a administrar os sacramentos... em caso de grave necessidade de uma comunidade, tais sacerdotes estão obrigados a administrar os sacramentos, ainda com risco de suas vidas, com tal que haja esperança razoável de assistir e não haja nada mais que que assista”. Esta obrigação rege sob pena de pecado mortal (Merkelbach – 3, 87).

3º - Obrigação em virtude da ordenação. Outros autores dizem que tais sacerdotes estão obrigados a prover os sacramentos não somente por caridade, mas também em virtude de sua própria ordenação sacramental.

Eis a explicação: “Estão obrigado por uma certa obrigação geral que provém da ordem sagrada que receberam. Pois Nosso Senhor Jesus Cristo os fez sacerdotes para que se dedicassem a salvar almas. Por causa disto, seu dever especial é administrar os sacramentos. Isto é óbvio pelo rito de ordenação, que lhes dá o poder de oferecer o sacrifício e absolver os pecados, e que especifica administrar os restantes sacramentos entre seus outros deveres... Esta obrigação vincula mais gravemente conforme a gravidade da necessidade espiritual dos fieis da diocese de onde se supõe que realize seu ministério o sacerdote, ou do lugar de onde vive. Quando uma tal comunidade está obviamente em necessidade grave – quando, v.g., devido a escassez de sacerdotes ou confessores, as pessoas não têm forma conveniente de assistir à missa aos domingos e festas de guarda e receber a Eucaristia, ou de onde é inconveniente para as pessoas frequentar o sacramento da penitência, de maneira que muitos permaneçam em pecado – um sacerdote tem um obrigação grave de administrar estes sacramentos e de preparar-se apropriadamente para o dever de confessor” (Aertnys-Damen, Theologia Moralis – 2, 26: “Generali quadam obligatione tenentur ex ordine suscepto... in necessitate simpliciter gravi talis communitatis... gravis est obligatio...”).

Estes princípios se aplicam da seguinte maneira: Após o Vaticano II quase todos os bispos e sacerdotes com “cura animarum” desertaram para a nova religião. Os poucos sacerdotes que resistiram, por outra parte, eram professores, párias em suas ordens religiosas ou diocese, retirados etc.

Estes sacerdotes estiveram obrigados por direito divino a prover os sacramentos aos católicos, os quais, como seus pastores haviam apostatado, neste ponto estavam “obviamente em necessidade grave”. Os sacerdotes não estavam obrigados a “buscar uma permissão”. Ou melhor, estiveram obrigados, tanto por caridade como em virtude de sua ordenação, a batizar, absolver, celebrar a missa etc.
E mais, entre estes os bispos Lefebvre e Thuc estiveram obrigados a conferir as sagradas ordens a candidatos dignos que continuariam provendo os sacramentos aos fieis católicos em todo o mundo.

Sua obrigação provinha da sagrada ordem do episcopado que ambos receberam. A exortação – contida em uma única frase – dirigida ao candidato no rito da consagração episcopal expressa esta obrigação sucintamente: “É dever do bispo julgar, interpretar, consagrar, ordenar, oferecer o sacrifício, batizar e confirmar”.

Ademais, aqueles de entre nós que derivamos nossas ordens dos arcebispos Lefebvre e Thuc, obviamente, não temos nenhum título para a “cura animarum”. Porém, como todos os demais sacerdotes, estamos igualmente obrigados pelo direito divino, por caridade e em virtude da ordenação, a prover os sacramentos aos fieis que permanecem em grave necessidade comum.

Resumo
O direito divino obriga os sacerdotes e bispos católicos tradicionalistas a administrar os sacramentos aos fieis;
O mesmo direito divino também os prove da delegação legítima e da missão apostólica para seu apostolado;
As leis humanas eclesiásticas (canônicas) cuja aplicação impede cumprir com a lei divina cessam por ser agora prejudiciais (nociva);
Isto implica o cânon 879, que requer uma concessão expressa de jurisdição para a validez da absolvição;
Em lugar disso, o direito divino delega diretamente a jurisdição no foro interno aos sacerdotes católicos tradicionais para a absolvição que transmitem;
Cristo mesmo ordena a seus sacerdotes que dispensem seus sacramentos ao seu rebanho. Tendo em vista que os pastores facultados com jurisdição para a “cura animarum” desertaram para a religião modernista, sua obrigação agora recai em nós, os poucos sacerdotes fieis que permaneceram.
Conferimos os sacramentos de Cristo porque Ele fez disso nosso dever.

Revmo. Padre Anthony Cekada – Julho/2003

(Extraído do blogue Católicos Alerta)

quarta-feira, 28 de junho de 2017

303ª Nota - Uma contraditória concepção sobre a visibilidade da Igreja



Alguns “católicos antimodernistas” usam como principal razão para permanecer na igreja pós-conciliar  (Vaticano II) a necessidade da nota de visibilidade da Igreja Católica, e, pelo fato de que a igreja pós-conciliar é visível, reprovam os sedevacantistas por estarem fora dela como se estivessem fora da Igreja Católica.

Entretanto, o que a igreja pós-conciliar de cargos burocráticos, poder, espetáculo propagandístico e ritual tenha de católica é totalmente invisível a eles mesmos, pois o visível é pura apostasia e desvio religioso. Esses antimodernistas “projetam” a Santa Igreja Católica, historicamente Una, sobre essa igreja morta.

Pois bem.

De que serve a visibilidade de um estabelecimento irreligioso onde a nota católica é totalmente invisível e necessita ser imaginada?

De que serve essa “catolicidade herdada, mas fantasmagórica”, se ela é totalmente invisível, e quando intimada ao culto do Deus verdadeiro, não o faz visível, oficial e universal, a não ser para satisfação daquelas pessoas presas a tradições que não pertencem àquela que chamam “Igreja visível”? 

De que serve a Igreja Católica tradicional, que amam, se não conseguem vê-la ou encontrá-la, e se ela não tem em seus “representantes autorizados e divinamente assistidos” doutrina católica ortodoxa, nem (salvo raríssimas exceções) sacerdócio, nem eucaristia, nem absolvição válidos?

Enfim, apelam para o princípio da visibilidade, porém confiam em uma igreja invisível, que administra contraveneno invisível contra a igreja visível, que é, por sua vez, obstáculo e negação evidentes da invisível...

Quanta loucura para não ficar sozinho, e não ter que baixar um pouco a cabeça e dizer “ergo erravi”.
Patrício Shaw

(Extraído do blogue Católicos Alerta)

terça-feira, 13 de junho de 2017

302ª Nota - Podem os fiéis denunciar os hereges antes do juízo da Igreja?


PODEMOS AFIRMAR ALTO E BOM SOM QUE ALGUÉM É INIMIGO DA IGREJA ANTES DE SEU VEREDITO?

Continuamente aparece esta pergunta quando se fala de temas relacionados com o sedevacantismo, sobretudo em boca dos “reconhecer-resistir”. Quando o oponente carece de argumentos, surge a objeção de que os sedevacantistas não têm nenhuma autoridade para dizer o que dizem – por exemplo, para determinar quem é herege, ou dizer se uma conclusão teológica particular de fato é a correta – como se requeresse um ato da autoridade para discernir se um homem é católico ou herege, ou como se o ensinamento católico se levasse a cabo somente em teoria, porém nunca se permitisse aplicar na prática a uma situação concreta.

Esta tática não é nova, e o grande antimodernista P. Félix Sardá y Salvany refutou faz mais de 100 anos em sua monumental obra O Liberalismo é Pecado (1886). Este livro foi respaldado e louvado pela Sagrada Congregação do Vaticano do Santo Ofício sob o Papa Leão XIII. O livro expõe as ideias e táticas dos modernistas, chamados liberais, e não deixamos de recomendá-la. De fato, pode-se dizer que este livro destrói por completo muitas ideias fundamentais do falso Concílio Vaticano II (1962-65) e a nova religião que gerou (que chamamos a religião Novus Ordo).

É lamentável, e talvez revelador, que hoje escutamos os argumentos que utilizavam os modernistas, repetidos agora pelos que se consideram a si mesmos católicos tradicionais.

O capítulo 37 de O Liberalismo é Pecado se refere especificamente à objeção de que um leigo não pode descobrir a heresia por sua conta, e/ou não se pode acusar a outro de ser herege. Nada mais longe da verdade!

XXXVII - SE É OU NÃO É INDISPENSÁVEL EM CADA CASO PARTICULAR RECORRER AO VEREDITO CONCRETO DA IGREJA E DE SEUS PASTORES PARA SABER SE UM ESCRITO OU PESSOA DEVEM REPUDIAR-SE E COMBATER-SE COMO LIBERAIS.

“Tudo o que acabais de expor, dirá alguém ao chegar a este ponto, encontra na prática uma dificuldade gravíssima. Tendes falado de pessoas e escritos liberais, recomendando com todo o empenho que fujamos, como da peste, deles e até dos seus mais remotos laivos de Liberalismo.

Mas, quem se atreverá, por si só, a qualificar de liberal tal pessoa ou escrito sem mediar o veredito decisivo da Igreja docente, que os declare tais?

EIS AQUI UM ESCRÚPULO, OU, ANTES, UMA TOLICE, MUITO EM VOGA DE ALGUNS ANOS PARA CÁ, POR PARTE DOS LIBERAIS E DOS MAIS OU MENOS INFLUENCIADOS DE LIBERALISMO; TEORIA NOVA NA IGREJA DE DEUS, E QUE TEMOS VISTO COM ASSOMBRO PERFILHADA POR QUEM NUNCA IMAGINARÍAMOS PUDESSE CAIR EM TAIS ABERRAÇÕES; teoria, além disso, tão cômoda para o diabo e seus sequazes que apenas um bom católico os ataca ou desmascara, imediatamente os vemos acudir por ela e refugiar-se em suas trincheiras, perguntando com ares de magistral autoridade: ‘E quem sois vós para qualificar-me de liberal, a mim e ao meu jornal? Quem vos constituiu mestres em Israel para declarar quem é bom católico e quem não o é? É a vós que se há de pedir patente de Catolicismo?’

Para qualificar uma pessoa ou um escrito de liberais, deve-se aguardar sempre a sentença concreta da Igreja docente sobre tal pessoa ou escrito?

Responderemos categoricamente que de modo nenhum!

A ser certo este paradoxo liberal, fora indubitavelmente o meio mais eficaz para que na prática ficassem sem efeito todas as condenações da Igreja, com respeito assim a pessoas como a escritos.

A Igreja é a única que possui o supremo magistério doutrinal de direito e de fato, juris et facti, sendo a sua suprema autoridade, personificada no Papa, a única que definitivamente e sem apelação pode qualificar doutrinas em abstrato, e declarar que tais doutrinas as contém ou ensina em concreto o livro de tal ou tal pessoa; (...).

Pois bem. Tudo isto se refere ao veredito último e decisivo, ao veredito solene e autorizado, ao veredito irreformável e inapelável, ao veredito que temos chamado de última instância. Mas não exclui para luz e guia dos fiéis outras decisões menos autorizadas, porém, também muito respeitáveis, que não podem desprezar-se, e que podem até obrigar em consciência o fiel cristão. São as seguintes...: (...) 5ª – A da simples razão humana devidamente ilustrada. Sim, senhor, até isto é lugar teológico, como se diz em teologia, quer dizer é critério científico em matéria de religião. A fé domina a razão; esta deve estar-lhe em tudo subordinada. Porém é falso que a razão nada possa por si só; é falso que a luz inferior acendida por Deus no entendimento humano não alumie nada, ainda que não alumie tanto como a luz superior. (...)

Subamos, porém, a uma consideração mais geral. De que serviria a regra de fé e costumes, se a cada caso particular não pudesse fazer imediata aplicação dela o simples fiel, mas devesse andar de contínuo a consultar o Papa e o Pasto diocesano?”

(Excerto extraído do blogue Amor de La Verdad)